Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões
de Gases de Efeito Estufa (SBCE)
Conheça a lei que regulamenta o mercado de carbono no país e os efeitos no setor do biogás.
Por Fábio Soares - Colunista do Portal Energia e Biogás
No dia 12 de dezembro de 2024, foi publicado no Diário Oficial da União que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou a Lei nº 15.042 de 11 de dezembro de 2024, que cria o mercado regulado de carbono no Brasil, marcando um importante avanço na agenda ambiental e climática do país. Essa medida posiciona o Brasil como um dos protagonistas na transição para uma economia de baixo carbono, ao mesmo tempo em que alinha o país às tendências globais de mitigação das mudanças climáticas.
Contexto do Mercado de Carbono
O mercado de carbono é um mecanismo que permite precificar as emissões de gases de efeito estufa (GEE), estabelecendo limites para setores e atividades econômicas que contribuem significativamente para essas emissões. As empresas que emitirem abaixo dos limites definidos podem comercializar os créditos de carbono gerados com outras que ultrapassarem esses limites, criando um sistema de incentivos financeiros para adoção de práticas sustentáveis.
No Brasil, esse tipo de mercado vinha sendo explorado apenas em caráter voluntário. Com a sanção da nova lei, a implementação de um mercado regulado, também chamado de "cap-and-trade¹", estabelece um marco legal e regulatório para as transações de créditos de carbono. Esse passo é essencial para garantir maior transparência, confiabilidade e previsibilidade ao sistema, tornando-o mais atrativo tanto para investidores nacionais quanto internacionais.
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Benefícios para o Brasil
A criação do mercado regulado de carbono traz uma série de benefícios para o país:
- Cumprimento de metas climáticas: o Brasil é signatário do Acordo de Paris e assumiu compromissos para reduzir suas emissões de GEE. Um mercado regulado de carbono fornece os meios necessários para que esses objetivos sejam alcançados de forma mais eficiente.
- Impulso à inovação tecnológica: a precificação do carbono cria incentivos para o desenvolvimento de tecnologias limpas e a adoção de práticas mais sustentáveis nos setores industrial, energético e agropecuário.
- Atração de investimentos: um mercado bem regulado pode atrair investidores estrangeiros, especialmente aqueles de países e regiões onde a neutralidade de carbono é uma exigência crescente.
- Fortalecimento da economia verde: o mercado regulado de carbono deve estimular o crescimento de setores que já contribuem para a descarbonização, como energias renováveis, conservação florestal, agricultura de baixa emissão e o reaproveitamento de resíduos.
- Consolidação do Brasil como protagonista climático: a medida reforça a posição do Brasil como um líder global na luta contra as mudanças climáticas, ampliando sua relevância em negociações internacionais.
Implicações para os Setores Produtivos
A lei também gera impactos diretos sobre os setores econômicos que possuem altas emissões de carbono, como indústrias de base, energia e transporte. Esses setores precisarão adotar soluções para reduzir suas emissões, sob pena de terem que adquirir créditos no mercado. Isso pode impulsionar a transição para fontes renováveis de energia, melhorar a eficiência energética e fomentar a economia circular.
Em contrapartida, setores que oferecem soluções sustentáveis, como o biogás, energia solar e eólica, devem se beneficiar. Esses setores podem gerar créditos de carbono a partir de seus projetos e comercializá-los, aumentando sua competitividade e lucratividade.
Desafios na Implementação
Embora os benefícios sejam amplos, há desafios significativos na implementação do mercado regulado de carbono no Brasil:
- Regulação Efetiva: o sucesso do mercado dependerá de regras claras e de uma governança eficiente. Questões como a definição de limites de emissões, mecanismos de monitoramento e auditoria serão cruciais.
- Engajamento dos Setores Produtivos: a adesão ao mercado regulado pode gerar resistência, especialmente em setores tradicionais. Será necessário promover conscientização e capacitação.
- Compatibilidade Internacional: para atrair investidores estrangeiros, os créditos de carbono brasileiros precisarão ser compatíveis com padrões internacionais.
- Inclusão de Pequenos Produtores: pequenas empresas e produtores rurais também deverão ser integrados ao sistema, com suporte financeiro e técnico adequado.
Benefícios e Oportunidades para o Setor de Biogás
O setor de biogás pode ser um dos grandes beneficiados com a criação do mercado regulado de carbono no Brasil, pelas seguintes razões:
1. Redução de Emissões como Ativo Econômico
O biogás é produzido a partir da decomposição anaeróbia dos resíduos orgânicos, como resíduos agroindustriais, a fração orgânica dos resíduos sólidos urbanos (FORSU) e efluentes diversos. Esse processo não só evita a emissão de metano (um GEE extremamente impactante) na atmosfera, como também oferece uma fonte renovável de energia. Ao gerar créditos de carbono, empresas do setor de biogás poderão monetizar suas práticas sustentáveis, aumentando a rentabilidade dos projetos.
2. Incentivo ao Aproveitamento de Resíduos
Com o mercado regulado, haverá maior demanda por soluções que reduzam emissões em cadeias produtivas, como a agricultura, o setor pecuário e o tratamento de resíduos sólidos. Isso pode estimular o desenvolvimento de novos projetos de biogás em aterros sanitários, granjas e indústrias, integrando resíduos que antes eram descartados inadequadamente.
3. Competitividade no Setor Energético
O biogás tem a vantagem de ser uma fonte versátil: pode ser convertido em eletricidade, calor ou biometano (substituto do gás natural). Com a regulamentação do mercado de carbono, o custo relativo de combustíveis fósseis pode aumentar devido à precificação do carbono, tornando o biometano mais competitivo no mercado de energia.
4. Exportação de Créditos de Carbono
Com a sanção da lei, o Brasil pode se tornar um exportador relevante de créditos de carbono no mercado internacional. Projetos de biogás podem atrair investidores estrangeiros interessados em financiar iniciativas com grande potencial de redução de emissões, sobretudo em setores com alta intensidade de resíduos.
5. Desenvolvimento Tecnológico e Geração de Empregos
O mercado de carbono pode impulsionar a inovação tecnológica no setor de biogás, incentivando pesquisas para aumentar a eficiência dos processos de produção. Além disso, o crescimento da indústria de biogás pode gerar empregos diretos e indiretos em áreas como operação de plantas, transporte e manutenção.
Desafios para o Setor
Embora as oportunidades sejam vastas, alguns desafios merecem atenção:
- Regulação clara e consistente: O sucesso do mercado de carbono depende de regras bem definidas, que evitem incertezas jurídicas e incentivem o investimento.
- Capacitação técnica: Pequenos e médios produtores de biogás podem necessitar de suporte técnico e financeiro para aderirem ao mercado de carbono.
- Conectividade com o mercado global: A compatibilidade dos créditos de carbono brasileiros com padrões internacionais será essencial para atrair investimentos externos.
Conclusão
A sanção da Lei nº 15.042 de 11 de dezembro de 2024 que cria o mercado regulado de carbono é um passo fundamental para fortalecer a política climática do Brasil e promover o desenvolvimento sustentável além de ser um marco estratégico para consolidar o Brasil como um líder na economia verde. O sucesso desse mercado dependerá de um equilíbrio entre regulação, incentivos e inclusão, permitindo que o país aproveite plenamente as oportunidades oferecidas pela economia de baixo carbono. Para o setor de biogás, a medida oferece múltiplas oportunidades de expansão e valorização, transformando resíduos em ativos financeiros e contribuindo para a descarbonização da matriz energética.
Com o devido apoio regulatório e incentivo à inovação, o biogás pode se tornar um dos pilares da transição energética no Brasil.
Referências Consultadas
- BRASIL. Lei nº 15.042, de 11 de dezembro de 2024. Institui o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE); e altera as Leis nºs 12.187, de 29 de dezembro de 2009, 12.651, de 25 de maio de 2012 (Código Florestal), 6.385, de 7 de dezembro de 1976 (Lei da Comissão de Valores Mobiliários), e 6.015, de 31 de dezembro de 1973 (Lei de Registros Públicos). Diário Oficial da União, Brasília, DF, 12 dez. 2024. Seção 1, p. 4. Disponível em: <https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/lei-n-15.042-de-11-de-dezembro-de-2024-601124199>. Acesso em: 27/12/2024.
¹ Cap and Trade, ou em português, limite e comércio, é um mecanismo de mercado utilizado para reduzir as emissões de gases do efeito estufa e combater as mudanças climáticas. A ideia central é estabelecer um limite máximo de emissões (o "cap") e permitir que as empresas comprem e vendam permissões para emitir uma certa quantidade de gases (o "trade").
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A coluna Horizontes do Biogás aborda questões importantes relacionadas à gestão de resíduos e análises das emissões de GEE para uma transição energética de baixo carbono.
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Autor: Fábio Soares
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